Mãos ao alto: R$ 7 é um assalto

Em 2013, ao escrever sobre o aumento das passagens em Nilópolis, cravei que a cidade possuía o quilômetro rodado mais caro do Brasil. Desde então, sempre que acordo e descubro um novo reajuste nas tarifas, me sinto como Bill Murray em Feitiço do Tempo e revejo o velho texto.

Há quase 10 anos, na esteira das mobilizações que tomaram as ruas por todo o país, nossa mobilização colocou milhares de pessoas nas ruas de Nilópolis, forçando o então prefeito Alessandro Calazans a voltar atrás. Sim, nós barramos o aumento das passagens dos ônibus municipais.

O contexto político e econômico agora é outro. Tal como o Brasil, o estado do RJ afundou numa crise sem precedentes. Perdemos 800 mil empregos só nos últimos 5 anos e, hoje, somos 1,5 milhão de desempregados e 2 milhões em situação de pobreza, todos sem perspectiva de mudança.

O que também não muda é o impacto de um transporte caro e precário sobre a vida das pessoas. Naturalizamos o movimento pendular ao trabalhar ou estudar longe de casa e voltar ao fim do dia. Essa bola de demolição é a exploração extra de quem vive nos subúrbios e nas periferias.

De acordo com o Mapa das Desigualdades produzido pela Casa Fluminense, cerca de 42% dos moradores de Nilópolis que possuem vida profissional ativa trabalham no Rio de Janeiro. Muitos estudantes e pessoas em busca de serviços diversos também se deslocam diariamente rumo à capital.

A forma mais barata de se chegar ao Rio ainda é pelos trens da SuperVia. Entretanto, a passagem que hoje já custa R$ 5 chegará aos R$ 7 a partir de fevereiro. Em muitos casos, ainda é preciso tomar mais um ônibus ou o metrô, cuja tarifa por meio do Bilhete Único totaliza R$ 8,55.

Assim, se esse morador de Nilópolis for 5 dias por semana ao Rio, seu custo mensal é de pelo menos R$ 342, podendo chegar à marca anual de R$ 4.446. Isto é, o estudante, trabalhador e/ou empregador precisa arcar com mais de 4 salários-mínimos apenas para despesas de deslocamento.

Nilópolis, 1975 / Jornal do Brasil

E se, por acaso, esse mesmo nilopolitano ainda carecer de um ônibus municipal para chegar à estação de trem, a conta pode chegar a incríveis R$ 25,00 por dia ou R$ 500,00 por mês. São R$ 6.500,00 por ano, sem incluir alimentação e outros gastos essenciais. Dá mesmo pra se viver?

Com o aumento das tarifas, agrava-se também a dificuldade de contratação de quem mora nos subúrbios e periferias. Devido ao alto custo de seu deslocamento, as raras e já muito concorridas vagas de emprego sempre serão destinadas àqueles que demandam um menor custo ao empregador.

Por isso, não é incomum vermos trabalhadores arcarem com o valor parcial ou total de sua passagem, além dos 6% descontados de seu salário para o vale-transporte. Na atual conjuntura, muitos topam pagar para conseguir algum emprego, exemplo da brutal precarização da vida no Rio.

O transporte público, afinal, se tornou o principal custo diário dos trabalhadores nas metrópoles afora. No Rio, a ineficiência do serviço é acentuada pelas desigualdades e por seu histórico projeto de gentrificação — empregos em zonas nobres e distantes da maioria da população.

Neste cenário, fica evidente que qualquer reajuste é perverso e injusto. Para debater a questão com seriedade, é preciso democratizar o processo, com uma efetiva transparência nas contas das empresas do transporte público e ampla participação popular nas análises e nas decisões.

Mais do que isso, combater a crise no Rio é enfrentar seu projeto histórico de apartamento e apagamento do povo, dos centros para o subúrbio, Baixada e favelas. Só construiremos uma cidade mais justa, democrática e para as pessoas por meio de uma efetiva e popular Reforma Urbana.

Rennan Cantuária é sociólogo pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, assessor de planejamento na Fundação Municipal de Saúde de Niterói e educador popular.